É Golpe, sim!

Em 1964 os militares brasileiros, sob o guarda chuva das forças armadas americanas e de suas forças políticas, tomaram o poder no Brasil. Nunca se teve dúvidas de que foi um golpe de estado que se transformou imediatamente numa ditadura feroz.

Por Carlos Signorelli (CAP)
Comissão de Assessoria Permanente

Mas, se nas décadas de 60-80 os golpes de estado via forças militares aconteciam na América Latina com a presença onisciente e onipotente dos EUA, a partir do motivo sempre apresentado que era o perigo comunista, nos últimos anos, após o fim do grande oponente, as forças golpistas mudaram o mote: agora é a corrupção! Além disso, os militares americanos não mais precisam estar presentes. Afinal, cidadãos do local a ser invadido são educados e treinados para os substituírem.

Mas o ponto mais importante, e que difere profundamente dos golpes anteriores é que é criada uma conjunção de forças  internas que fazem com que o golpe não receba este nome, mas apenas um ato previsto na constituição.  Assim foi em Honduras, na deposição do presidente Manuel Zelaya, em 2009, como no Paraguai, em 2012, na deposição de Fernando Lugo. Nesses lugares, o poder legislativo se une com o poder judiciário e com a grande mídia e constroem o golpe, a partir de um motivo criado: em Honduras o pedido de plebiscito para a reeleição do cargo de presidente, no Paraguai, uma desocupação de sem terras, na qual, hoje se sabe, policiais e camponeses foram mortes  por policiais lá alocados para isso.

E agora, no Brasil!

Logo depois do segundo turno das eleições presidenciais de 2014, o candidato derrotado e a coligação e partidos que o apoiou insistiu em recontagem e mesmo em nova eleição, com a acusação de resultado manipulado. Não deu certo o argumento e buscou-se em outro campo o argumento do golpe. Este foi encontrado na corrupção.

Já desde antes de 2014, sob os holofotes da grande mídia, os agentes públicos da Polícia Federal, do Ministério Público e do Judiciário, sob o comando do juiz Sergio Moro, usavam de suas práticas para culpabilizar o PT de toda a corrupção brasileira, não obstante o aparecimento de nomes de outros partidos. Estes eram “esquecidos” e não divulgados, incluindo as acusações e provas que contra eles e elas haviam. Inclusive, antes do 2º. Turno das eleições de 2014, os membros da PF faziam campanha dirdta nas mídias sociais contra a candidata Dilma Roussef.

Assim, a partir do endeusamento do juiz Sérgio Moro,  impregnou-se parte da opinião pública brasileira contra o Partido dos Trabalhadores e seus membros, e mesmo nada aparecendo contra a presidenta Dilma Roussef, partiu-se para o pedido do “impeachment”. O primeiro ator no “script” do golpe foi o Tribunal de Contas da União(TCU) que “encontrou” o motivo: as chamadas “pedaladas fiscais” que, pouco depois, foi demonstrado que não existiram.

Por outro lado,o Poder Legislativo, a Câmara dos Deputados tornou-se domínio de um dos maiores corruptos da história do Brasil, o qual conduziu o processo da forma mais dirigida para o fim que se queria, culminando com a vergonha internacional do dia 17 abril quando deputados e deputadas acorreram ao microfone para votar pelo “impeachment” em nome de seus cônjuges, de suas famílias, de suas igrejas, de Deus… Uma vergonha internacional, na qual esses fugazes caricatos e comediantes tornaram o Brasil e seu congresso um circo, o que fez com que o respeito pelo nosso país despencasse.

Na camarilha do golpe, elemento chave foi o vice-presidente que, mesmo entre seus “amigos” recebe  o adjetivo de “traíra”, o qual, afastada a Presidenta, forma o seu governo no qual mais da metade são nomes acusados na própria operação Lava-Jato. Logo nos primeiros dias o chamado “interino” é obrigado a trocar  alguns de seus nomeados por incompetências, inabilidades e por causa de visíveis atos de corrupção. Assim, muito embora corruptos possam fazer parte de seu governo, nem mulheres e nem negros podem. Além disso, a supressão de ministérios ligados aos direitos da pessoa, bem como outros que são tidos como de manipulação da esquerda, como o Ministério da Cultura dá o rosto do governo do “interino”. Na verdade, todos os órgãos de comunicação são re-dimensionados.

Logo após a posse, gravações aparecem nas quais figuras do governo e do Congresso mostram  que os motivos reais do impedimento da Presidenta são outros: o medo  de caírem nos processos de corrupção e perderem seus mandatos, a eliminação do que chamam de “petismo” e seu projeto de país. Além disso, os aumentos salariais ao setor da justiça e do MPF, que criaram um déficit imenso nas contas públicas mostra à evidencia os agentes que consubstanciaram a vergonha do dia 17 de abril.

A mídia não só se cala frente a tais fatos. Ao contrário, fazendo de contas de que nenhum fato desabonador  está presente no governo do “interino”, exige que ele leve a cabo, antes mesmo das eleições, e mesmo antes das definições finais do processo do “impeachment” no Senado, todo o projeto destruidor dos direitos do trabalhador já anunciado. Além disso, outro gesto destruidor é o anunciado pelo ministro H.Meirelles de que todo o conjunto de empresas estatais deve ser vendido e nada deve ficar nas mãos do Estado. Privatização total!

Mas as situações propiciadas pelo chamado “chanceler” Serra são as mais características da ação americana no golpe, ou seja, a pura demonstração de que a mão azul-vermelha está manipulando o momento histórico brasileiro. Demonstrativo das relações umbilicais entre golpistas e EUA foi a atitude de senador do PSDB ir aos EUA para “explicar” o que estava acontecendo, como se eles não o soubessem.

Lembremo-nos de que ao longo dos três governos liderados pelo PT as chamadas Relações Exteriores foram pautadas pela independência e pelas ligações sul-sul. Assim, na América Latina a eliminação da ALCA, projeto americano, a ampliação das ações junto ao Mercosul, relações positivas com governos  com as mesmas características do governo independente do Brasil. Mas o grande gesto de uma nova opção nas relações externas foi a assinatura junto com Rússia, China, Índia e África do Sul de criação do Banco de Desenvolvimento dos Brics como um paralelo do FMI, do BIRD, organismos de dominação americana e neoliberal. Tais ações colocaram o Brasil na pauta das ações de desestabilização dos organismos como o FBI e a CIA.

Aliás, sabe-se, hoje, que este último organismo é a sede ideológica e econômica de cursos  para lideranças latino-americanas  que possam fazer frente aos governos de centro-esquerda que não se alinham ao poder americano. Sabe-se que várias lideranças brasileiras fizeram tais cursos, dirigidos e orientados por entidades sustentadas  por aquele organismo. E sabe-se, também, que grupos anti-governo, como os que participaram das manifestações anti-Dilma foram e são sustentados por grupos econômicos ligados às grandes empresas americanas, principalmente na área do petróleo.

A vergonha do dia 17 de abril vai concretizar e finalizar o golpe ao final do mês de agosto, pelo que parece. Todas as forças políticas já estão arregimentadas, quer seja para o sim ao “impeachment” quer seja o para o não da cassação do ex-presidente da Câmara. Como disse Sartre em uma de suas peças teatrais, “Os Dados Estão Lançados”. A única força que poderá alterar seus resultados será a formação da consciência crítica que poderá colocar o povo nas ruas.

Que nos socorra Paulo Freire, defenestrado que foi nas passeadas dos favoráveis ao golpe.

(Na próxima reflexão, as maldades que virão contra os trabalhadores e trabalhadoras)

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